Ela disse adeus àqueles beijos com gosto de isopor

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Ela não estava atraída pelo moço, mas disse “sim” ao pedido de namoro. Ah, e, por favor, não a julgue. Ela já se condenou o suficiente por isso. Ela estava sem nenhuma imunidade emocional quando permitiu esse vínculo, por isso, seja empático,  ao invés de juiz.

Fizeram-na acreditar, ao longo da vida, que o amor se constroi com a convivência. Incutiram, na mente dela, desde criança, que o importante é a pessoa ser honesta e ter bom caráter.  Ela fora, a vida inteira, condicionada a acreditar que casamento é regado a sacrifício. E, para piorar, seu grupo religioso  massificava a ideia de que a mulher, somente ela, é responsável por construir e manter um casamento próspero.

Ela permitiu que a historia continuasse, mesmo sem borboletas no estômago, mesmo com aqueles beijos com gosto de isopor. Ela queria acreditar  que as coisas melhorassem com o tempo, tentando ignorar a voz da própria alma.

Aos olhos dos outros, ela tinha tirado a sorte grande ao lado daquele homem, um suposto genro dos sonhos para os seus pais. Mas, constantemente, lidava com aquela sensação de sapato que não serve nos pés. Como administrar aquele desconforto de não “sentir-se em casa” dentro dos raros abraços do rapaz?  Uma voz ilusória dizia: “tenha paciência, o amor nasce com o tempo, não vá abrir mão desse moço por conta dessas besteiras que você lê nos romances.”

Aparentemente, ela estava  com tudo nas mãos. Entretanto, quando deitava a cabeça no travesseiro, a mente fervia. Ao invés de sentir aquele frenesi gostoso, tão característico dos inícios dos romances, ela sentia-se angustiada. E, assim,  ela adormeceu, várias vezes, sobre o travesseiro encharcado de lágrimas.

Os familiares e amigos parabenizando-a pelo namoro. Não faltavam elogios ao rapaz, que de fato, possuía muitas virtudes. Contudo, ela sentia-se apática, como que vivendo uma farsa. Ela não estava empolgada, sem entusiasmo algum.  Ela enganava a todos, menos a si mesma. Sabe quando você sente receio de frustrar as expectativas alheias? Sei que você pode estar pensando “dane-se os outro, eu é que tenho que estar bem”. Acontece que ela não tinha essa percepção. Ela veio de um histórico de completa submissão e de negação das próprias vontades. Na verdade, ela era vítima de vítimas. E o namoro  insosso foi promovido a noivado e, posteriormente, a casamento.

Contrariando as próprias expectativas,  o amor, a paixão e o frio na barriga não deram o ar da graça. Pelo contrário, a situação estava cada vez mais crítica.  Ah, e a moça tão intensa, tão cheia de amor para dar e tão louca para receber. Era como ter fome de um banquete regado a churrasco e ter que se conformar com um prato de alface murcha.  Em que planeta foi  parar o beijo travoso de umbu cajá, que o Alceu Valença canta?

À  cada pergunta dessa natureza, a resposta vinha em forma de angústia, e, às vezes, regada à lágrima. Estranhamente, ela não encontrou nenhum acolhimento por parte das pessoas, nas poucas vezes em que ela tentou falar sobre a realidade do seu relacionamento. O que ouvia era que ela estava “chorando de barriga cheia”, afinal, aquele moço não era um homem com vícios, tinha estabilidade profissional e tinha boa reputação.

Por fim, ela optou por silenciar as queixas e desabafos e mergulhou em si mesma. Ignorou  os ruídos externos e dedicou-se a ouvir o que sua alma gritava.  Mergulhou numa longa fase de introspecção, tal qual uma águia quando se isola para trocar as garras.  Tempos depois,  ressurgiu. Ela tinha consciência do quanto seria julgada pelas duas famílias, mas não se intimidou,  disse ao marido que não tinha condições de seguir com aquele casamento sem sintonia,  algo semelhante a duas pessoas que dividem despesas numa casa. O seu desejo era alguém para dividir a vida. Sobre arrependimento e saudades? Ela não sente. Como sentir saudades de alguém que nunca pertenceu a ela? Saudades a gente sente é de pessoas ou situações que nos deu abrigo, pouco importa se por um instante ou por uma vida inteira.

“Encalhada não é aquela pessoa que está solteira, e, sim,  aquela que está mal casada.” (Padre Fábio de Melo).

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